terça-feira, 9 de julho de 2013

Dom Vicente Marchetti Zioni


     Retomando meu blog, confesso, resolvi apelar e publicar aqui um texto já pronto, que escrevi para o livro Um homem – relatos sobre a vida de Dom Vicente Marchetti Zioni, organizado por Adriana Ribeiro Fontes, Lívia Almeida, Maria Eni Ribeiro de Mello, Renato Vieira de Mello e Wellington Lopes.


     Um exemplo até mesmo nas pequenas coisas



     Meu avô parava a caminhonete em frente de casa e ao ouvir o barulho eu já ia correndo ao seu encontro. Outras vezes ficava na porta, já esperando. Na maioria das vezes o programa era ir para o sítio. Mas também havia algo que, apesar das lembranças vagas, eu gostava: pegar as malas dos cursilhistas na Catedral e levar para a Casa Santo Inácio. O velho Anacleto Ivo Garzezi queria a minha companhia e eu a dele. Mas a “desculpa” era que ele precisava da minha ajuda, o que era impossível, pois com menos de 10 anos de idade, eu não suportava o peso daquelas cargas.
     Mas já começava aí a ficar clara a importância da Igreja Católica na minha vida e de quebra tive ainda o privilégio de ter conhecido dom Vicente Ângelo José Marchetti Zioni, com quem mais tarde eu teria maior contato. Esses momentos me fizeram ter mais histórias com o meu avô e ver pelas primeiras vezes o arcebispo, uma figura tão chamativa e emblemática para um garotinho. Naquele momento, começava a ser forjado o futuro coroinha Stéfano Garzezi Cassetari. Não sei explicar tão bem o motivo de tanta emoção, mas havia inclusive uma certa magia nisso tudo. Talvez o ambiente e a figura de dom Zioni proporcionassem esse sentimento.


     E hoje também digo com orgulho que meu avô trabalhou para o cursilho, inclusive na cozinha desse movimento criado por dom Vicente em nossa Diocese.



     A agitação antes das missas celebradas pelo arcebispo



     Geralmente as missas tinham mais de 10 coroinhas auxiliando o padre Ludovico de Lara Camargo. Mas quando alguém ficava sabendo que alguma missa seria celebrada por dom Vicente Marchetti Zioni, a notícia se espalhava e esse número ao menos dobrava. Uma boa parte da criançada – e naquele tempo só havia meninos como coroinhas e todos bem jovens – não escondia a empolgação. Havia muita agitação, apesar daqueles que eram mais tranquilos quanto a isso. E quando era usado incenso, havia muita expectativa para decidir quem levaria o turíbulo. Com muita alegria, posso dizer que eu era um dos meninos em meio a isso tudo.
     E depois das missas de domingo sempre tinha um jogo de futebol no campo que ficava atrás do Seminário.
     Lembro-me de alguns dos coroinhas, mas nem todos os que citarei jogavam bola: Vinícius Fonseca Rodrigues, Daniel Salvador, Luís Roberto Gatto, Eduardo Nardini, Renato Castro, Milton Flávio Lautenschlager Filho, Gustavo Kurosawa, Marcos César Paes, dentre outros que a memória não ajuda a resgatar os nomes, apesar de ver tão bem os rostos em minha mente.
     O jeito daquele arcebispo era inspirador. Parecia reservado, equilibrado, mas ao mesmo tempo era doce nas palavras e solícito também. Eu sempre o bombardeava com perguntas, muitas até bobas, algo natural para um garoto tão novo, mas ele estava sempre pronto para responder. Ao mesmo tempo em que impunha respeito com sua simples presença, além do gestual e da fala, era um bom ouvinte e incentivador da nossa participação. Eu achava que ele parecia um pouco com o meu avô e que ambos tinham o jeitão do John Wayne, meu herói dos filmes de faroeste. Coisas de criança...
     Enfim, é impossível falar da minha infância sem falar dessa época, dos amigos conquistados nesse ambiente, da igreja e de dom Zioni.



     A chegada ao TLC



     “Dai-me, Senhor, a graça de melhor vos conhecer”.
     Esse trecho da Oração do TLC, feita por dom Zioni, foi uma das coisas mais marcantes quando fiz o Treinamento de Liderança Cristã, a convite de uma amiga. Foi aí que pude conhecer mais do legado do arcebispo com o qual pude conviver durante vários anos. Naquele momento entendia e sentia que ao criar esse movimento, ele estava nos proporcionando uma chance tão importante de conhecer Deus, de uma forma mais bonita e marcante.
     Acho curioso lembrar ainda que me chamava a atenção saber que dom Zioni, já octagenário, acessava a internet. Pessoas muito mais jovens, naquela época, tinha dificuldade em navegar na web Eu achava isso o máximo! Um exemplo até mesmo nas pequenas coisas.
     De qualquer forma, dom Zioni deixou sua marca nas pessoas através de sua atuação. E isso foi o mais importante.

     - Stéfano Garzezi Cassetari.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

O que aconteceu com aqueles caras bacanas do PT?


Eu era adolescente. Eu ainda não podia votar e logo teríamos eleições, inclusive para eleger o presidente. Procurei o PT e trabalhei na campanha para eleger Lula. Eu queria Lula mas algo muito forte me dizia que além dessa convicção, havia outra tão importante quanto a ser considerada, a de que Collor deveria ser evitado a todo custo.
Collor acabou eleito. O tempo passou e o então presidente Fernando Collor de Mello estava para perder o mandato. E lá fui eu para as ruas com a cara pintada de verde e amarelo protestando contra ele e pedindo seu impeachment, junto com dezenas de outros jovens. E pelo Brasil, lindamente aquilo se repetia. Me envolvi bastante com o movimento em Botucatu.
Me emocionei quando Collor teve seu impeachment aprovado e mais ainda quando vi José Genoino desmaiando no plenário do Congresso ao fim da votação, tamanha sua felicidade por um momento em que tornava-se possível punir um corrupto.
Muito importante para todos os brasileiros aquele momento e ainda mais para o líder e então deputado petista, que tanto havia sofrido na ditadura. Agora tínhamos democracia, presidente eleito pelo voto direto e logo depois o mesmo presidente com o mandato perdido por não ter agido corretamente, digamos assim, para que eu não perca a compostura durante a elaboração deste singelo texto.
Algum tempo depois, trabalhando para as rádios PRF-8 e Cultura FM, fui incumbido de entrevistar José Genoíno. Nem lembro o assunto. Lembro que ele era candidato a alguma coisa. Liguei no comitê dele em São Paulo e disseram que ele não estava. Quando eu disse do que se tratava me deram o telefone da casa dele. Eu fiquei surpreso, mas liguei. A esposa dele atendeu e me deu o celular dele. Eu fiquei mais surpreso ainda, liguei e o cara me deu a entrevista, sendo muito educado e muito solícito o tempo todo.  
Fugindo totalmente do contexto, lembro que alguns dias depois eu estava com uns amigos em São Paulo, indo a um bar, a pé, e passamos em frente a outro estabelecimento que estava fechado para uma festa política. Deu para ver de fora ao menos José Genoino, José Dirceu e José Serra. Achei muito legal eles serem adversários e conversarem em uma festa. Digo isso apenas lembrar que todos podem ser adversários, mas que ninguém precisa ser inimigo. Os caciques sabem disso, mas os soldados rasos infelizmente não, levando tudo a ferro e fogo.  Alguns integrantes do PT, principalmente de Botucatu (mas não só), precisam entender que o partido não é a coisa mais importante do mundo. Tem muitas coisas que valem mais, como amizade, respeito, etc...
Enfim, voltando ao assunto, naquela época eu só pensava que aqueles caras do PT eram muito bacanas.
Agora, acabo de ler na capa do UOL: “Condenado a quase 7 anos, Genoino cumprirá pena no semiaberto”. E me pergunto o que terá acontecido com aqueles caras bacanas do PT...
E fico feliz com o destino de José Genoino e seus comparsas. E fico triste quando amigos do PT tentam defender essa corja. E mais ainda quando tentam desqualificar quem critica a corja, inclusive eu. Não interessa, ao menos agora, o que o PSDB fez (E PELA ÚLTIMA VEZ, EU NÃO SOU DO PSDB, SOU APENAS UM CIDADÃO QUE PAGA IMPOSTOS, CUMPRE DEVERES E QUER DIREITOS!!! AGORA ESTAMOS DISCUTINDO E JULGANDO A CORJA DO PT. E SEI QUE TEM MUITA GENTE BOA NO PT TAMBÉM!!!!). Senão, quando Collor sofreu impeachment, deveria ter sido poupado por conta do que outros presidentes fizeram, que foram coisas muito piores...
Não adianta mais a prostituta velha, daquela antigo local de venda de prazeres sexuais, dizer a um cliente jovem e inocente que é virgem. Não cola mais.

·         Stéfano Garzezi Cassetari.

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

CONTRA O ATAQUE DE ALGUNS ALOPRADOS: Pedido de um cidadão ao senhor Ielo e a alguns dos seus seguidores políticos: não voltem a chamar a população de vendida!!!


Publicado no facebook durante as eleições de 2012 e agora colocado no blog para que fique registrado.


Olá a todos! Antes de entrar no referido assunto, preciso fazer um esclarecimento: me refiro a alguns seguidores por saber que nem todos do PT concordam com alguns posicionamentos do senhor Ielo e de outros dos seus apoiadores. Trata-se de no máximo duas dúzias aloprados e não interferem no respeito que tenho pela história do PT e por pessoas desse partido que fazem parte da minha família (meus pais inclusive) e por amigos que frequentam a minha casa e de meus familiares.

Agora sim, lá vou eu: 

Faço este desabafo como cidadão, como botucatuense, como alguém que tem família, amigos, profissão, alguém que comete erros e acertos, mas que não admite ser chamado de vendido junto com outras 34.550 pessoas.

Senhor Ielo e alguns de seus seguidores, por favor, confirmando-se o resultado da pesquisa do Diário da Serra no dia 7 de outubro de 2012, não voltem a dizer que a eleição foi comprada. Isso não afeta ao João Cury (o que não é problema meu), isso afeta milhares de pessoas. Os senhores não mereciam um processo do João Cury em 2008 por terem dito isso, mereciam um processo de 34.551 pessoas que tem família e trabalham honestamente!!! X-salada???? R$ 20,00??? 34.551 pessoas se venderam por um X-salada e R$ 20,00??? É isso que os senhores afirmam???? Nas eleições passadas João Cury teve 34.551 votos (53,58%) contra 22.918 (35,54%) do candidato petista Valdemar Pereira de Pinho e os senhores continuam afirmando que aquele pleito foi comprado... Portanto, os senhores estão dizendo que 34.551 pessoas não tem caráter em Botucatu (tomando como base o resultado das últimas eleições).

Como cidadão, agradeço desde já a Lourival Antonio Panhozzi (4.953 votos – 7,68%) e Milton Bosco (PV – 3,19%), que apesar da diferença, jamais taxaram o povo botucatuense de vendido!
Em tempo: acho que o Ielo foi um bom prefeito. Na minha opinião, o João também o foi. Mas nessa disputa eleitoral não justifica chamar os botucatuenses de comprados como fizeram Ielo e como fazem alguns de seus seguidores, inclusive de forma aberta, no facebook e outras redes sociais!!!
Tudo tem limite e isso extrapola o limite do bom-senso.

Quanto aos ataques a nós, trabalhadores do Diário da Serra, falarei posteriormente...
Tem gente que inventa conspirações e acredita nelas para sanar as angústias da frustração... Tem gente que acorda cedo e trabalha duro para saber enfrentar todos os problemas que a vida naturalmente impõe, sem precisar criar fantasmas.

Tem gente que prefere inventar e alimentar demônios. Tem gente que prefere criar anjos e alimentá-los com amor. E o amor leva a coisas boas como a tolerância, o respeito, a amizade, a humildade, etc... 

Por hoje é só e sorte a todos!!!

·         Stéfano Garzezi Cassetari

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Um bom texto é importante, mas é fundamental ter uma boa agenda


            Convidado pela revista B2B, escrevi o texto que segue abaixo. Depois da circulação da revista, compartilho no blog.
Primeiramente fico muito feliz em estar escrevendo para a B2B e vou aproveitar o espaço para conversar com jornalistas, com aqueles que pensam em encarar os desafios dessa profissão, com estudantes de comunicação social e também com empresários que tem ou pretendem ter assessoria de imprensa.
Sempre digo aos jornalistas mais novos e também para quem pensa em fazer faculdade de comunicação social, que não há nenhuma dúvida sobre a importância de escrever bem. Mas quem vai se destacar e se diferenciar dos demais é quem tem uma boa agenda, ou seja, nomes e telefones de pessoas importantes para passar informações. São as chamadas fontes.
Posso dizer que nunca tive um texto espetacular, mas sempre escrevi de um jeito leve e principalmente, sempre tive boas fontes. Relacionamento é uma palavra cada vez mais importante em todas as áreas e não é diferente no jornalismo. Só assim o jornalista vai conseguir os bons furos de reportagem, ou seja, com os contatos estratégicos.
Para quem trabalha com assessoria de imprensa ou pretende atuar nesse mercado, também é importante ter bons contatos nas redações. Conseguir a publicação de um texto falando de uma empresa , serviço ou produto, depende da boa vontade do editor, mas não totalmente. Depende também de um bom relacionamento do assessor de imprensa com os responsáveis pelas equipes dos veículos de comunicação.
Provavelmente, um release recebido de uma assessoria de imprensa vai ficar esquecido na caixa de e-mails até ser deletado. Mas isso pode mudar desde que o jornalista se aproxime de quem é importante. Visitas nas redações e alguns telefones de vez em quando não tomam muito tempo e são fundamentais.
Fica assim, também, uma importante dica para quem for contratar um jornalista para atuar na sua assessoria de imprensa: contrate alguém que escreva bem, claro, mas que tenha também bom relacionamento com pessoas estratégicas para o seu negócio.
E como estamos em época de eleições, uma dica para os candidatos: mais importante do que ter um assessor comprometido com seu partido, é ter alguém engajado na questão do relacionamento com os veículos.
Vou contar dois casos que servem como exemplo. Eu era diretor de redação do Diário e também fazia reportagens sobre política. Mas eu sempre fiz questão de ter boas fontes nos mais diversos segmentos. Um oficial da PM estava apresentando aos seus comandados as novas armas recebidas do Governo e acabou disparando acidentalmente uma pistola, atingindo um soldado na perna. Poderia ter sido pior, mas felizmente não foi grave. Outro soldado me ligou no instante seguinte contando o fato. Demos um furo de reportagem e surpreendemos até mesmo o comando da polícia com o fato de nossa equipe ter ficado sabendo de algo que era para ter sido abafado.
Outro caso bem mais simples, foi de um amigo que trabalhava com assessoria de imprensa em São Paulo para uma grande marca de produtos alimentícios. Ele me mandou um release de um produto novo. Eu não dei atenção, afinal, consideramos esse tipo de divulgação puramente comercial e que precisa ser paga.
Gratuitamente, publicamos o que é de interesse público. Mas esse jornalista me ligou, insistiu, falou das dificuldades em conseguir a publicação, da falta de atenção dos editores e diretores de redação, que se saísse no jornal seria importante para ele e também para valorizar o trabalho das assessorias.  Enfim, a conversa dele me dobrou. E eu publiquei. Tive boa vontade, mas precisei ser convencido.
Espero ter ajudado de alguma forma e mostrado um pouco mais do que exige o mercado. Boa sorte aos profissionais de imprensa e aos empresários com suas assessorias!
         
          * Stéfano Garzezi Cassetari.

sexta-feira, 20 de julho de 2012

A rebelião de 1997 em Botucatu: por dentro da panela de pressão


No final, lá estava eu, intercalando entre vomitar, chorar e também tomando calmante na tentativa melhorar o estado emocional. Só naquele momento, no sofá da sala de minha casa, estava me dando conta do que eu havia presenciado. Saldo de dois mortos e quase 10 feridos na cadeia de Botucatu.
Era um final de tarde em meados de julho de 1997.  O Haroldo Amaral, então diretor de redação do Diário da Serra, havia saído para fazer uma reportagem sobre algo tranquilo com o fotógrafo Sidney Trovão, mas nem me lembro o assunto. Eu era chefe de reportagem e estava na redação, preparando o fechamento da edição.
Logo mais o Haroldo me ligou contando que ele e o Trovão resolveram seguir uma viatura que passou em alta velocidade e com sirene ligada. A viatura parou em frente a cadeia de Botucatu, no Bairro Alto, onde formava-se uma grande agitação com policiais chegando e os dois perceberam uma fumaça saindo do prédio. Assim, logo entenderam que era um problema sério.
Sabendo da gravidade dos fatos, me apressei e fui para a cadeia. Por um lado era meu dever ficar e terminar o processo de fechamento para a nossa gráfica rodar a edição a tempo, mas algo dentro de mim dizia que o melhor era me juntar aos outros dois integrantes da equipe. Os demais repórteres já tinham terminado suas coisas e ido cada qual para sua casa. O diagramador Edil Gomes e o impressor gráfico Marcos Tinós ficaram lá, parados, esperando alguma notícia.
Na cadeia realmente o clima era dos piores. A liderança da rebelião tinha sido assumida por um preso bastante jovem, recém-transferido para cá e chamado de Léozinho pelos companheiros. Um delegado me disse no local que na verdade o rapaz era o interlocutor e não o líder. Mas enfim, o detendo se apresentou como mentor e assim ficou conhecido. Começaram a torturar vários detentos. Os castigos começaram à noite, mas só terminaram no dia seguinte, embora as vítimas de assassinato tenham sucumbido antes.
Como jornalista consegui alguns furos de reportagem que contarei em próximo artigo, na semana que vem. Como cidadão vi a fragilidade de todos diante de tais fatos. Como ser humano, lamentei a que ponto chegamos... Desde então tenho pensado cada vez mais em uma célebre frase de Jean-Jacques Rousseau: “Todo homem nasce bom, mas a sociedade o corrompe"..
Apenas para dar uma ideia do que eu tenho a contar, uma bomba quase explodiu ao meu lado, quase os presos derrubaram uma parede e ganharam a rua, dei o furo com os nomes dos presos assassinados, confirmei a notícia da morte de um preso para sua amante e ainda tive a tristeza de saber que uma mãe, que tinha tido a filha estuprada por seu marido e o havia denunciado, lhe fazia visitas na cadeia - e sendo assim, na minha opinião e pelo meu conceito, ela foi de heroína a vilã na mesma história.
E ainda eu ajudei a Rádio Clube na sua cobertura da rebelião e do meu celular ficava passando informações ao vivo, enquanto fazia a cobertura para o Diário da Serra, depois com reforço outros integrantes da equipe que se juntaram a mim, ao Haroldo e ao Trovão.

O assunto foi sugestão do Douglas Fernandes, cara de fino trato, bom ouvinte, propenso a ser jornalista e a quem mando daqui um abraço.

Stéfano Garzezi Cassetari

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Menudo, menino da bicicleta amarela, jardineiro que virou soldado e o amante da Joana


         Era sair de casa, dar uns passos pelas ruas e lá estava ele, o cara que corria feito doido... Bom, na verdade acho melhor explicar algumas coisas antes.
Gostei de ter recordado as histórias do último texto, que remetem à minha infância, a fatos e pessoas interessantes de Botucatu. Lembrando de mais algumas figuras pitorescas da cidade, esses dias me vieram à memória aqueles que marcaram a minha adolescência.
Bom, o cara que corria feito doido era doido mesmo. Eu sei, não é o termo correto. Mas deixem-me explicar: claro, ele tinha problemas mentais, algum atraso provavelmente, mas era doido de correr tanto daquele jeito!!! É um jeito até carinhoso de me referir a ele e era como todos falavam na época, mas dava até certa inveja de tanto pique. O Menudo, como todos da minha época se referiam a ele, era um sujeito cerca de 10 anos mais velho, porém com jeito de menino.  Educado, até mesmo doce no trato com as pessoas, estava sempre sujo, com roupas surradas, cabelos encaracolados e desgrenhados, com os olhos claros parecendo tristes e distantes.
O Menudo - e não faço ideia do motivo pelo qual ganhou esse apelido -, conversava pouco e depois de responder poucas perguntas da turma, sempre fugia das conversas com a mesma explicação:
- Preciso correr, dizia ele, já dando passadas largas até sumir longe dos nossos olhares atentos e indagativos.
As pessoas queriam saber o motivo de o Menudo correr tanto, se ele tinha família, onde ele morava, qual a sua idade, dentre outras coisas. Mas ele não respondia nada disso. Só dava opiniões, e mesmo assim poucas, quando o assunto era se ia chover o fazer sol e amenidades do gênero, coisas colocadas em pauta para ver se ele se soltava. Mas não adiantava. O sujeito sorria, dava um sinal de joia e já saia correndo.
Havia um boato de que o Menudo teria ficado daquele jeito por ter tomado chá de cogumelo. Mas eu sempre achei mesmo que fosse algum problema de atraso mental. A verdade ninguém da minha turma soube até hoje. E ele sumiu. Desde então, nunca mais foi visto na cidade. Mais um mistério sobre o corredor sorridente e calado...
O menino da bicicleta amarela era quase a mesma coisa se comparado ao Menudo. Quase. Ele olhava pra gente, sempre sentado em sua bicicleta amarela, ficava sorrindo de um jeito estranho, parecendo até sarcástico. Para ele, nem apelido deram. Também pudera. Às vezes, não contente em apenas olhar, jogava pedras. Era um pouco mais velho. Na minha turma a média de idade era 15 anos e ele devia ter uns 20. Mas era todo judiado. Parecia uma mistura do Beavis com o Butt-head do desenho. Também diziam que ele teria ficado daquele jeito por ter tomado chá de cogumelo. De novo o chá de cogumelo. Mas no caso dele, não sei não...
Ao contrário do título, o jardineiro não tornou-se soldado. Não me lembro o nome dele, mas o sujeito cuidava do jardim da casa dos meus pais. O cara era realmente trabalhador, afinal de contas, fazia trabalho pesado mesmo mancando. Um belo dia, desapareceu...
Não sei com o que foi mais complicado de lidar, se com o fato do jardineiro ter voltado depois de vários meses, querendo o trabalho de volta, e para isso ir logo dizendo com toda seriedade do mundo que esteve lutando na Guerra do Golfo, ou a partir daí, barbudo e cabeludo, se vestir com a camisa do Flamengo, uma bandana, meiões e shorts de futebol, para ficar cantando na Praça da Catedral, principalmente nos dias de feira. É outro que, depois disso, sumiu do mapa.
Bom, teve uma outra coisa difícil de lidar também. Injuriado com essas histórias, meu pai resolveu assumir os cuidados com o jardim e na intenção de podar, passou a assassinar plantas. Terrível!
O cara que eu chamo de amante da Joana, na verdade não era nenhuma figura conhecida, só vi uma vez, eu assumo, mas me proporcionou um momento marcante. Eu havia passado a tarde na AAB, onde fiz uma aula de natação e outra de tênis.  Minha irmã mais nova era da mesma turma de natação. Voltando para casa a pé, nos deparamos na Avenida Dom Lúcio, um pouco antes da lanchonete A Libanesa, com um sujeito que caiu aos pés dela e aos berros começou a implorar:
- Joana!!! Por favor Joana, não me deixe!!! Volte para mim, Joana!
Detalhe: o nome da minha irmã é Déborah e ela nem namorava ainda.
O sujeito era bem mais velho, estava bêbado e minha irmã assustada pedia ajuda. Fiquei na frente do cara, falei de forma dura e ele se mandou.
Mas passado o susto, resolvi ficar rindo da minha irmã por conta do ocorrido e chamando-a de Joana. Ela me ameaçou de vingança uma única vez. E como eu não parei, ela resolveu contra-atacar.
A vingança foi impiedosa. Alguns metros à nossa frente, uma turma de veteranos da Unesp dava trotes nos calouros. Minha irmã não teve dúvida e gritou para aquela galera enorme:
- Meu irmão passou na Unesp também! Foi o 14º colocado em medicina...
E lá fui eu me danar. Me tiraram a camiseta, rasparam meus cabelos ali mesmo, pintaram meu rosto, meus braços, minhas costas e minhas pernas. Depois de um bom tempo consegui me safar.  No caminho até em casa, parentes e amigos me viram daquele jeito e me deram os parabéns. Nem se deram conta de que eu não tinha idade para prestar vestibular. Em casa foi difícil explicar tudo aquilo e tirar a tinta da pele. E foi o dia em que fui calouro da Unesp por um tempinho. Paguei mico.
E ao menos foi assim que vi isso tudo acontecer...

* Stéfano Garzezi Cassetari.'.

quarta-feira, 9 de maio de 2012

Chico Lindo, Negão do Pau e outras figuras pitorescas da cidade

Fico lembrando cada vez mais da minha infância. Talvez isso esteja acontecendo devido ao fato da idade estar avançando. Não que eu seja velho, mas posso dizer que lembro de coisas da cidade desconhecidas dos mais novos, como poder brincar de bola, esconde-esconde, pega-pega ou mãe da rua em plena Rua Dr. Cardoso de Almeida, onde eu morava, próximo da Igreja Nossa Senhora de Lourdes, sendo eu e meus amigos raramente incomodados pelos carros. E é desse lugar que tenho importantes e algumas outras curiosas lembranças, inclusive de figuras pitorescas que por ali circulavam.
Uma dessas pessoas que chamavam a atenção de todos e principalmente da criançada era o Chico Lindo, mulato de uns 30 anos e sempre muito alinhado. Cabelos pretos e um pouco mais compridos atrás, sempre com muito gel, pele bronzeada, diria até mesmo que chegava a ser de cor marrom, olhos grandes e marcantes, estatura mediana e uma barriga a entregar que estava acima do peso, ele tinha atraso mental, era bastante educado, até mesmo doce no jeito de tratar a todos e adorava conversar.
Sempre bem vestido, com calça, camisa e sapatos sociais, Chico Lindo tinha uma paixão maior do que bater papo: uma grande coleção de relógios! Ele ficava conversando com a molecada e sua felicidade era ainda maior quando alguém lhe perguntava as horas, pois assim podia exibir orgulhoso o relógio que trazia no pulso e ainda abrir uma pasta da qual não desgrudava e onde havia muitos outros relógios para conferir  os números para os quais os ponteiros apontavam.
E quase todos os dias Chico Lindo passava pela Cardoso, conversava com a criançada que brincava na rua, falava as horas e ia embora feliz. Do ponto de vista psicológico, era uma criança que se realizava com pouco.
Sempre que ia sair de casa, mesmo que para rapidamente atravessar a rua e entrar na casa do amigo que morava em frente, olhava atentamente para ver se o Negão do Pau estava por ali. E se estivesse, o negócio era correr para dentro e esperar.
Negão do Pau era como todos chamavam um homem negro, careca, alto, forte, que andava com um saco em uma mão e um pedaço de pau na outra, mas aparentemente inofensivo.
Todos diziam que ele descia o porrete em quem cruzasse seu caminho, mesmo sem motivo algum. Pelo sim pelo não, eu achava melhor evitar qualquer proximidade.
Um incidente provocado por ele marcou minha infância. A então namorada de um grande amigo de meu irmão, que chegou a me dar aulas de português no colégio, estava andando por perto de onde eu morava, quando ao virar uma esquina deu de cara com o Negão do Pau. E não deu outra. Tomou uma paulada na cabeça que abriu-lhe um corte e lá foi ela, levada ao hospital para ganhar um baita remendo.
Certo dia, minha mãe desabafou sobre esse caso com a dona Nenê, a mulher que lavava as roupas lá em casa, falando também de sua preocupação com os filhos e ouviu como resposta algo que deixou a todos surpresos:
- Dona, o Negão do Pau se chama Inocente e é meu irmão. Não sabemos mais o que fazer... – disse daquela pessoa tão calma e serena que era a dona Nenê.
Não sei o que foi mais curioso e ao mesmo tempo surpreendente, se ele ser irmão dessa tão boa senhora, ou ter o nome de Inocente!
O Ahuya (escolhi essa grafia para dar um charme) foi uma das figuras mais cheia de mistérios. Uns diziam que ele morava na rua, outros que residia em um hotel e ainda havia relatos de ter família e casa na cidade.
Loiro, de olhos claros, pele muito branca, barbado, Ahuya andava principalmente pela Rua Amando de Barros dando gritos como “ahuyaaaaa”, “ahyyyyyyy” e coisas do gênero. Também ficava horas olhando para o céu e apontando algo que só ele via. Mas era engraçado quando transeuntes achavam realmente que algo estava sendo avistado e ficavam ao seu lado, procurando algo que nunca encontravam.
Também era comum o Ahuya parar no meio da rua, desabotoar a calça jeans sempre suja, abrir o zíper e urinar olhando os motoristas passando.
Eis que um belo dia esse personagem desapareceu. E então surgiram diversas versões a respeito de seu sumiço, sendo a mais comentada, a de que teria ateado fogo ao corpo e assim falecido, que pertencia a uma família muito rica e seu féretro foi levado a São Paulo em um jatinho enviado pelo pai.
Quantas lembranças! E ainda há outras. Mas vou ficando por aqui.
E no próximo texto vou falar de outras figuras pitorescas... Até lá, quem quiser, que conte outra.
·        Stéfano Garzezi Cassetari